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sábado, 26 de fevereiro de 2011

Uma entrevista histórica com o pastor José Pimentel de Carvalho

O pastor José Pimentel de Carvalho, presidente da Assembléia de Deus em Curitiba, é dos últimos obreiros ainda vivo que conviveu com os pioneiros suecos antigos líderes das Assembléias de Deus, e com outros pastores que fizeram história na denominação e ajudaram a moldar a igreja nesses quase cem anos de sua existência no Brasil.

Presidente da CGADB por seis mandatos e presidente da AD de Curitiba desde 1962, este ancião concedeu no final do ano de 1987 uma entrevista em Joinville ao periódico “O Assembleiano”. Na época no alto de seus 71 anos com 42 anos de ministério, ele expressou-se sobre alguns assuntos que ainda hoje geram polêmica dentro da denominação.

Por ser um representante legítimo de uma geração de obreiros quase que extinta, selecionei trechos da entrevista onde em seguida faço alguns comentários para situar o leitor historicamente.

O Assembleiano: Há quarenta e dois anos, no início do seu pastorado, era mais fácil conduzir a igreja?

Pimentel: Era mais fácil, porque o crente respeitava mais a autoridade pastoral. Havia mais imposição e menos discussão, em torno de certos assuntos. Esses eram como regras estabelecidas e o crente obedecia ou era disciplinado.

Tal situação somente era possível, pois a grande maioria de crentes eram pessoas simples, que aceitavam as regras de igreja de forma muito passiva. Certas interdições, proibições ou imposições eram plenamente assimiladas por gente humilde, sem estudo e de condição material limitada. Com o passar dos anos a igreja mudou seu perfil social. Membros com mais escolaridade e nível social maior tendem a questionar mais, se impor mais e com isso causar certos conflitos dentro das igrejas. Pastor Pimentel estava vivendo esse momento de transição e se lembrava com certo saudosismo do tempo de irrestrita obediência as regras da igreja.

O Assembleiano: O senhor deve estar entrando, talvez, na sua última década...

Pimentel: Eu creio que sim.

Ele cria, porém a crença não se confirmou, pois esse senhor no presente momento com 94 anos de idade continua presidindo a AD curitibana. Já são 65 anos de ministério e 42 anos de liderança na igreja da capital paranaense. Sua longevidade no pastorado da igreja em Curitiba o faz parecer um verdadeiro papa no exercício do seu pontificado.

O Assembleiano: O senhor vê seu ministério mais aperfeiçoado, ou o considera no mesmo nível em que começou?

Pimentel: Eu me sinto com um ministério realizado, e tenho no meu coração uma dor muito grande pela obra de Deus. Eu fico preocupado quando observo esses pastores de laboratório...

O Assembleiano: O que o senhor entende por “pastores de laboratório”?

Pimentel: Esses institutos, onde se fazem cursos rasos de teologia, pois não temos professores gabaritados, onde as pessoas estudam durante 3 a 4 anos e já aparecem como bacharéis em Teologia, quando conhecem muito pouco, mas que influenciam e ficam criando problemas para a obra (...) Esta produção de pastores de laboratório está contribuindo para o surgimento de certos grupos que não se conformam comigo, com 42 anos de ministério. Não se conformam, porque pretendo manter aquela linha, até morrer, pois creio que a AD, que já fez 75 anos de existência, deve continuar a ser igreja pentecostal, e pentecostalismo não se mistura com o mundo. Então pretendo manter isto, os novos pastores estão apoiando grupos de idéias avançadas para o mundo, com novidades, inovações.

Como autêntico representante de uma época, pastor Pimentel ainda manifesta certas restrições aos institutos bíblicos. É evidente nesse ponto da entrevista a revelação entre o choque das lideranças mais antigas formadas junto aos pioneiros suecos e as novas lideranças moldadas nas instituições de ensino teológico.
Vale à pena refletir: quais mudanças esses novos pastores queriam? Quais problemas geravam? Quais inovações desejavam?

É inegável nesse ponto a constatação de que grupos dentro da denominação ansiavam por mudanças e transformações, ou para atender novas gerações de crentes mais escolarizadas e em plena ascensão social, ou devido a forte concorrência de novas igrejas pentecostais onde as proibições e as questões de “usos e costumes” inexistiam.

Outro dado importante é que a expressão “pastores de laboratório” sempre foi usada pela antiga liderança assembleiana para de forma pejorativa se criticar, impedir ou anular qualquer tentativa de criação de institutos bíblicos entre as Assembléias de Deus no Brasil. O argumento era que esses institutos criariam obreiros artificiais e mundanos, os quais estariam longe da “linha” de conduta ministerial dos pioneiros.

O Assembleiano: O senhor tem sido o arquiteto da unidade da igreja, enquanto Presidente da Convenção nacional. É possível manter essa unidade?

Pimentel: Hoje eu estou apenas apreciando o cenário e estou verificando que talvez esse fracionamento seja irreversível, isto porque o desvirtuar da unidade começou há muito tempo, por volta de 1940, de modo que convivi com o problema no Rio de Janeiro por 17 anos. Já na época, não houve formas de voltar à unidade e esse desvio avolumou-se.

Pastor Pimentel iniciou seu ministério no estado do Rio de Janeiro, e viu o surgimento de ministérios assembleianos que se tornaram concorrentes entre si.

Debaixo da mesma placa denominacional brigas ferozes ocorreram na disputa por membros, ministros e de campos de trabalho. Ao se referir ao ano de 1940 como início da fragmentação assembleiana, Pimentel estaria se reportando à fundação do ministério de Madureira por Paulo Leivas Macalão? É provável que sim, pois foi justamente em 1941 que Madureira conseguiu sua autonomia jurídica em relação à AD de São Cristóvão, igreja a qual ele era filiado.

Como bem observou, seguindo o exemplo de Madureira outros ministérios conquistaram sua autonomia, e ainda hoje a fragmentação continua. Atualmente a Assembléia de Deus é uma grande denominação fracionada em diversos ministérios que intensificaram ainda mais a concorrência entre si. E não é somente isso. As diferenças litúrgicas e teológicas cada vez mais se acentuam, tornando a igreja uma verdadeira Babel eclesiástica, onde cada um fala a sua língua e se conduz como achar melhor ou mais lucrativo. Fonte: O ASSEMBLEIANO. Joinville ano II nº6 dez 87/jan.88 p.5

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