Tramita na Câmara dos Deputados um acordo entre o Brasil e a Santa Sé, órgão máximo da Igreja Católica. Este acordo, chamado de Concordata, institui diversos privilégios para a Igreja Católica. Opa! Apenas para a Igreja Católica? Sim, isso mesmo, apenas para a Igreja Católica. Antes de entrarmos em maiores questões, vamos lembrar o parágrafo primeiro do artigo 19 da nossa constituição: “É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;”
Assim sendo, chegamos à primeira e óbvia conclusão: O acordo é inconstitucional. Agora, podemos e devemos analisar outros pontos: O presidente Lula assinou este acordo, com o Papa Bento XVI, no final do ano passado, e curiosamente às escondidas. Não comunicou nem o Legislativo. Por quê?
Além da assinatura de Lula, o acordo ainda precisa ser aprovado na Câmara dos Deputados e, vejam só, os deputados aprovaram que a votação fosse em caráter de urgência. Por que a pressa? Será que para não ter muita discussão sobre o assunto? Quer mais uma curiosa situação? A imprensa não tem noticiado praticamente nada a respeito disto. Será que é algo sem importância? Então, vejamos um pouco as conseqüências da “dita” concordata:
1- A assinatura de uma concordata implica o compromisso do Estado de fornecer à Igreja Católica determinados privilégios legais e financeiros para sempre, a menos que a Igreja concorde em abrir mão deles. Leis e até constituições podem ser mudadas pelo Legislativo da Nação, mas concordatas nao podem ser alteradas nem revogadas sem consentimento da Santa Sé. Uma vez assinadas, elas pairam acima de qualquer controle democrático do País.
2- O acordo institui privilégios de diversas naturezas à Igreja Católica, apenas à Igreja Católica, naturalmente. Por exemplo: O não-cumprimento das normas da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para com os funcionários que trabalham sob sua hierarquia; auxílio do Estado para a conservação do patrimônio católico; ensino religioso nas escolas públicas, etc. E peço uma atenção para este último, pois mesmo que o texto se refira ao “ensino religioso católico e de outras religiões” não é difícil imaginar o que acontecerá: as demais religiões, as minorias religiosas, especialmente as de matriz africana, as diversas faces do protestantismo e tantas outras manifestações religiosas do Brasil ficarão fora. Isso é o primeiro passo para que o catolicismo volte à condição de religião oficial novamente, com o Estado financiando a doutrinação católica de milhões de crianças brasileiras.
Onde está o respeito ao povo brasileiro? Onde está o respeito às outras religiões de nosso País? Onde está a transparência do presidente ao assinar algo tão impactante na vida da população brasileira? Onde está a imparcialidade dos grandes órgãos de imprensa? Tudo bem, não precisam responder. Estamos cansados de saber.
A verdade é que todos, até mesmo católicos, temos que nos posicionar contrários a essas medidas. Pois elas, além de desrespeitosas, de colocarem um nariz redondo e vermelho em todos nós, são inconstitucionais e vão contra a liberdade religiosa. E lembro aqui que a falta de liberdade religiosa é responsável, segundo a ONU, por 75% dos conflitos bélicos no mundo.
Agora, para encerrar definitivamente, analisemos um dos fundamentos expostos na Concordata: reconhecimento, das relações históricas entre a Igreja Católica e o Brasil e suas respectivas responsabilidades a serviço da sociedade e do bem integral da pessoa humana. Ah, por que não falou antes? Estou certo que estão se referindo ao tempo em que a igreja (católica) dizia que os negros não tinham alma, validando assim a escravidão, validando assim o verdadeiro Holocausto brasileiro. Aprovar a Concordata será um lastimável retrocesso na luta histórica pelo Estado Laico no Brasil.
Ricardo Barreira é presidente do Instituto Umbanda Fest
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quinta-feira, 23 de julho de 2009
O fim de um estado laico
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